Jovem campeã de xadrez vende livros no vão do Masp para completar renda
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(...) Depoimento a
RODOLFO LUCENA
RODOLFO LUCENA
A gaúcha Thauane de Medeiros aprendeu a jogar xadrez com oito anos e aos dez foi vice-campeã brasileira de sua categoria.
Aos 16 anos, mudou-se para São Paulo e hoje vive do xadrez com o apoio
de Mogi das Cruzes.
Vende os livros que escreve sobre o jogo na Paulista
para complementar sua renda
e sonha em ter uma escola de xadrez para
crianças. Em setembro de 2011,
ela enfrentou o campeão mundial Garry
Kasparov.
Eduardo Knapp/Folhapress | ||
A campeã de xadrez Thauane de Medeiros, em frente ao Masp, onde vende seus livros |
*
Jamais imaginei que um dia iria conhecer Kasparov. Ainda mais jogar
contra ele, apertar a mão dele. É um dos melhores jogadores de todos os
tempos, super frio, tático, estratégico. Ele tem um pouco de tudo. Foi
super legal estar frente a frente com um ícone do xadrez.
Cheguei a pensar que poderia empatar com ele, porém cometi um erro, e
ele conseguiu centralizar o rei e capturar meus peões. Foram 48 lances, 1
hora e 40 minutos.
Era uma simultânea contra 20 pessoas, eu fui a penúltima a sair. Poderia
ter ficado muito mais, ter sido a última, mas, como eu era a única que
jogava profissionalmente, eu não fui até o xeque-mate. O jogador
profissional sabe quando está perdido e, por respeito ao adversário,
abandona.
Vivo do xadrez desde os 16 anos, quando vim para São Paulo. Uns amigos
me disseram que algumas cidades aqui pagavam para você representar a
cidade em torneios. Antes eu já representava Florianópolis, onde morava
com minha família, mas por amor, não ganhava nada.
Em São Paulo, consegui apoio de Mogi das Cruzes. É uma bolsa, não dá
para tudo, então comecei a vender meus livros na avenida Paulista para
conseguir dinheiro para participar de torneios.
Quem me deu a ideia foi um amigo, que vendia livros de poesia. Primeiro,
fiz um CD sobre xadrez, contando a história do jogo, os movimentos das
peças, algumas partidas importantes. E contava um pouco também sobre
mim.
Aprendi a jogar aos oito anos. Meu cunhado me ensinou, mas em pouco
tempo eu estava ganhando dele. Então fui para uma escola que tinha
xadrez, para me desenvolver.
No primeiro campeonato, fiquei em quarto lugar; no segundo, fiquei em terceiro e, na terceira etapa, fui campeã.
Aos dez anos, fui vice-campeã brasileira e disputei pela primeira vez um
torneio fora do país, o Pan-Americano, em Bogotá, na Colômbia.
Minha mãe me acompanhou, lembro a felicidade dela ao subir no avião. Ela
jamais imaginava andar de avião e muito menos sair do país!
Hoje sou a campeã brasileira sub18 e sub20, no feminino. Representei o
Brasil no Mundial sub20 na Grécia, em 2012, mas não me saí muito bem.
Preciso estudar mais, mas ter um professor é muito caro.
Vendo os livros no vão do Masp (Museu de Arte de São Paulo), às quartas e
de sexta a domingo, das 9h ao meio-dia. É um trabalho difícil, você
ganha muitos "nãos", às vezes, é perigoso. Tem bêbados, drogados, já
roubaram meu celular, uma mochila com 40 livros...
Foi por causa do meu livro que enfrentei o Kasparov.
Estava vendendo na fila do museu e um senhor se interessou pela minha
história, disse que tinha um projeto em que poderia me encaixar.
Era o Paulo Skaf, presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do
Estado de São Paulo). Fui ajudar os alunos do Sesi com xadrez, fazendo
simultâneas e dando palestras. Acabei jogando contra o Kasparov em
setembro de 2011.